sábado, 3 de março de 2007

Sting: "será que eu sou medieval?"*


CD Songs From The Labyrinth (Universal)
2006

Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 128 (dezembro de 2006).




Há alguns meses atrás, foi dito aqui mesmo no IM - International Magazine [nota: em artigo que pode ser relido no blog Arquivo] que Sting, em sua carreira solo, mostrou-se "muito mais ousado do que jamais fora ao lado de seus ex-companheiros de banda". Verdade. Entretanto, justamente por essa ousadia (que muitos classificam como presunção ou cabecismo), o ex-Police conquistou a ojeriza de determinados setores da chamada crítica "especializada" - que provavelmente se irritam em observar no baixista um raro caso de pop star culto, apreciador de jazz e boa literatura, que mora em um castelo na Toscana, fala francês, coisa e tal.

Todavia, dessa vez, Sting quiçá venha a oferecer aos seus detratores mais munição do que o habitual, com o recém-lançado Songs From The Labyrinth (Universal). Não que seja um trabalho ruim. Absolutamente. Contudo, Songs... talvez seja o movimento mais inesperado do artista em muitos anos, comparável apenas ao reflexivo The Soul Cages, de 1991, concebido pelo artista ainda sob o impacto do falecimento de seu pai.

Ou seja, não se trata de um álbum para qualquer ouvido.

Quem esperava algo do calibre de "Brand New Day" ou "If You Love Somedody", irá se deparar com um álbum de instrumental esparso, conduzido apenas pelo alaúde (instrumento de cordas do século XVI), completamente despido de qualquer reminiscência pop. Sting apropriou-se das canções medievais do compositor elizabetano John Dowland (1563-1626) e cometeu um disco erudito, de inegável linearidade (as faixas assemelham-se umas às outras), que poderá soar tedioso aos seus antipatizantes.

Consta que o guitarrista argentino Dominic Miller, que acompanha Sting há quinze anos, presenteou-o com um alaúde - e esse foi o estopim para o contato com o especialista bósnio Edin Karamazov, que dividiu com o inglês a execução do instrumento em Songs....

É importante observar que, das 23 faixas do disco, apenas 16 são canções propriamente ditas: sete são trechos declamados da carta que John Dowland escreveu à corte inglesa em novembro de 1595.

Nesse melancólico trabalho, a maior audácia de Sting - cujos dotes vocais, aliás, não são propriamente adequados ao canto lírico - é retratar, de maneira fiel, a época em que as canções foram escritas, sem a preocupação de soar, em momento algum, contemporâneo. Finalizando: de qualquer forma, vale lembrar que Songs From The Labyrinth se encontra atualmente no primeiro lugar da parada britânica de música clássica.


* "Medieval II", Rogério Meanda & Cazuza, 1985.

Nenhum comentário: